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A Cor da Escrita

Páginas onde a ilustração e o desenho mancham de cor as letras nascidas em prosa ou em verso!

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Amizades do Coração

Tema 8

21.02.22, Olga Cardoso Pinto

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Era uma vez um coração pequenino, solitário, mirradinho pelo seu vazio. Às vezes inflava só de pensar na vontade de se encher com algo bonito, importante, digno de preencher o seu espaço mendinho que vivia dentro de si.
Este coração era lindo, sonhador, voluntarioso. Havia dias que aumentava um pouco quando se dedicava aos outros, quando a tarefa exigia sair de si mesmo, abrir-se numa nesga e deixar entrar um pouco dessa felicidade que lhe era tão avessa. Mas, finda a novidade e a distração do compromisso, voltava a contrair-se nessa diminuta existência, por vezes quase parava de palpitar por tão pouca atividade e dimensão.
Certo dia, deu-lhe para passear no jardim. O dia apresentava-se radioso. Era um dia de Primavera, a manhã nascera há pouco e ainda o orvalho existia nas pérolas que cintilavam, em jeito redondo, como um enfeite, nas folhas e nas tenras flores dos canteiros. As aves cirandavam, afoitas, como tomadas pela obrigação de uma atividade incansável. O nosso coraçãozinho deixou-se sentar num dos bancos, olhava encantado para um verdilhão que ensaiava o seu caraterístico canto. Muitos outros se lhe juntaram, parecia um coro afinado, bem ensaiado. Os cantares dos verdilhões soaram a bela melodia ao coração que, sem dar conta, se enchia um pouco, aumentava ligeiramente o seu tamanho, até mesmo a sua cor ganhava luminosidade e as paredes dos seus ventrículos distendiam-se mais amplamente, tal era a robustez do seu bombar. Decidiu que voltaria ao jardim todos os dias.
Foram-se sucedendo dias, semanas. Passara um mês e então, numa bela manhã, o nosso pequeno coração, de aspeto mais composto e saudável, vislumbrou ao longe, também sentado num banco do jardim, outro coração de aspeto velho, chupado e sem viço. Acercou-se educadamente e deu-lhe os bons dias. O outro respondeu-lhe. O nosso amigo coraçãozinho pediu licença para se sentar e este foi o mote para uma conversa. A partir daí foi um desfiar de palavras, de partilhas e emoções, no final, e com pena da separação, despediram-se combinando que todos os dias voltariam ali para conversarem.
Os meses foram rolando e tal como os verdilhões, mais corações se juntaram criando ligações e fazendo amizades. Uns já eram velhos, cansados da vida, mas com aquelas recentes amizades e trocas de conversas, ganhavam novo fôlego para mais uns anos de batimento. Outros mais jovens, em plena pujança, mas desanimados pelas vicissitudes da vida, encontravam ali uma forma de se sentirem mais felizes e úteis.
E o nosso amigo coração? Ah, este está como rejuvenescido! Encontrou um coração com quem tem muitas afinidades, sonhos e projetos. Começaram a namorar recentemente, sem deixarem de se encontrarem com o seu grupo de amigos no jardim. Contudo, agora vão ao cinema, passeiam pela baixa, viajam juntos para outros destinos e até pensam em partilhar a vida! O que faz ter um grupo de amigos. Nascem as amizades, germinam as ligações afetivas pela felicidade dos momentos partilhados, encontram-se corações nos quais os nossos se encaixam como um puzzle, sem esforço, sem imposição. Até nasce o amor! Sim, pois a amizade é o adubo, a água, o solo essencial para germinar o amor.
As amizades sinceras e genuínas enchem o nosso coração, inflam-no e recheiam-no de bons sentimentos, elas são o combustível essencial à vida.

 

Texto escrito no âmbito do Desafio da nossa querida Ana de Deus "52 semanas de 2022"

 

 

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