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A Cor da Escrita

Páginas onde a ilustração e o desenho mancham de cor as letras nascidas em prosa ou em verso!

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Celebrações

24.06.22, Olga Cardoso Pinto

caminho para a fonte de aguas santas.JPG

"O final da tarde chegava de mansinho, mas o sol ainda alto tornaria o dia no mais longo do ano. Lá longe, perto do rio, preparavam-se as fogueiras que seriam purificadoras para quem as saltasse e afoitavam-se as gentes no cozinhar da ceia para festejar o solstício de verão - não podiam faltar o peixe - esse ser do rio - o pão força para o corpo e o vinho dádiva da natureza e transformada pelos homens.
Nabica carregava Brígida ao colo, a seu lado caminhava Dulce que levava na bolsa do cinto a foicinha de prata e no braço o cesto do ritual de colher as ervas medicinais – o manjerico e o visco, tinham-nas colhido ao nascer do dia. Ausinda, mais afastada por não conseguir acompanhar o andar das jovens mulheres, levava no seu cesto papoilas e camomila para queimar como oferta ao sol e a Endovélico, todas elas levavam ao pescoço um lenço amarelo tingido com cascas de cebola. Alegremente cantavam e juntar-se-iam às celebrações sob as copas dos carvalhos com o rio serpenteando por perto. A idosa apreciava à distância as duas jovens, queria-lhes como filhas, e naquele dia sentia-se feliz por ver Nabica, finalmente, a recuperar a sua vivacidade, o seu gosto pela vida e pela filha adorada!
Iam as três animadas, embora Ausinda revelasse algum cansaço, pois fora um dia muito preenchido, como sacerdotisas celtas tinham iniciado as suas atividades dedicadas ao seu culto desde o nascer do dia. Cultuaram as divindades com oferendas e cânticos, em especial a Endovélico pedindo-lhe proteção e saúde, a Lug divindade solar que dá força à terra para gerar as culturas, a Atégina solicitando a sua bondade para com os solos férteis, a Nábia deusa das águas correntes para que estas não faltassem para a terra e a Sucellos para que protegesse a agricultura e as suas amadas florestas. De forma recatada fizeram as suas celebrações, sem sacrifício de animais, há muito que o tinham abandonado com receio de serem acusadas de heresia pela igreja e pelos vizinhos cristãos."

 

Excerto do romance O Abraço do Freixo.

Foto: caminho da Fonte de Águas Santas, Maia.

 

 

Para ouvir enquanto lê: The Cranberries "Why"

 

 

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