Um imenso coração
"Os dias urdiam as horas onde as memórias ancoravam, desejando ganhar viço e raízes no pequeno coração infantil. A menina pequenina, feita de saudades e odor, vivia com o pensamento numa história que a avó lhe contava quando iam lavar a roupa ao rio.
— Era uma vez um rio, forte, corredor, frio como o gelo, que bordejava uma aldeia pequena, encarrapitada num monte feito de granito antigo e de fraguedo imponente. Nesta aldeia viviam poucas famílias, com muitos filhos pequenos e uma só avó. Esta senhora idosa, velha, velhinha sem se saber a idade, tratava todas as crianças como netos, não se sabendo quais eram os verdadeiros. Mas pouco importava, pois todos os catraios eram mimados e adoçados com igual amor pegadiço como o mel.
— Mas avozinha, como pode ser a velhinha, avó de toda a aldeia?
— Pois então!? Pode ser sim senhor! O coração de uma avó é tão grande que cabe lá dentro todo um mundo!..."
Excerto do conto O Outro Lado do Rio de Olga Cardoso Pinto